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A ONU e o Direito Internacional


A Carta da ONU de 1945 em seu capítulo I informa que seus propósitos são os seguintes:

1. Manter a paz e a segurança internacionais e, para esse fim: tomar, coletivamente, medidas efetivas para evitar ameaças à paz e reprimir os atos de agressão ou outra qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos e de conformidade com os princípios da justiça e do direito internacional, a um ajuste ou solução das controvérsias ou situações que possam levar a uma perturbação da paz; 

2. Desenvolver relações amistosas entre as nações, baseadas no respeito ao princípio de igualdade de direitos e de autodeterminação dos povos, e tomar outras medidas apropriadas ao fortalecimento da paz universal;

3. Conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário, e para promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião; 

4. Ser um centro destinado a harmonizar a ação das nações para a consecução desses objetivos comuns.

É possível afirmar com razoável grau de segurança que no que diz respeito à  manutenção da paz e segurança internacionais há forte ceticismo por parte da opinião pública mundial, adjacente, porém é notável o esforço e a conclamação da ONU aos Estados para que estes encontrem soluções pacíficas para suas controvérsias. Fica-se, então com um balanço de que a ONU cumpriu 50/50 de seus propósitos. Isto não é desimportante, ao longo dos séculos os Estados se enfrentaram em conflitos sangrentos, o poder já foi a principal forma de solução de conflitos internacionais e a diplomacia tinha ares de coisa secreta quando não de espionagem deslavada.

A ordem Westfaliana que antecedeu a ordem contemporânea conhecia, do ponto de vista do direito das gentes, tã somente um ator: o Estado. Era por meio dele e em virtude de seus interesses que as forças profundas da história se mexiam. A abrangência da velha ordem Westfaliana se circunscrevia à região da Europa com algumas potências disputando o poder para o exercício da hegemonia no continente. A expansão europeia se deu em busca de riquezas e no interesse de novos mercados o que fez com que o sistema também se alargasse com o ingresso muitas vezes forçado de novos estados.

A ordem contemporânea criada pela ONU caracteriza-se pela ampla inter-relação dos vários atores internacionais que se traduz na intensificação das interações transnacionais, supranacionais ou cosmopolitas através das práticas estatais de caráter público ou privado, nas práticas capitalistas globais, ou nas interações sociais e culturais entre os povos e nas relações de poder entre centro e periferia.

A criação da ONU depois das duas grandes guerras, portanto, significa um avanço e marca uma transformação no sistema internacional em que o equilíbrio de poder que antes se localizava entre os principais estados europeus migra para São Francisco e será liderado por EUA e URSS dentro da nova organização. É a institucionalização de uma ordem pautada no pressuposto jurídico que visa um novo modelo normativo internacional. Portanto, não adotaremos a atitude comôda do pessimismo no que tange a avaliação da ONU.

Em certo sentido a ONU oferece ao mundo uma perspectiva de democracia internacional na medida em que se consagra como foro privilegiado de todos os assuntos internacionais que afetam a vida dos estados e, por extensão, das pessoas.

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